quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

VIA LÁCTEA


O título deste estudo é simples, é comum, mas é terno, pois é nossa casa, é o nosso sistema solar tão discutido em nossos dias (espero que sejam os últimos dias da história deste mundo que seria um oásis, um bálsamo para nós, os seus moradores, estaríamos hoje morando em uma jardim e não fazendo apologias, discusões, palestras, conferências sobre qual a posição da Via Láctea), o qual foi dado por Camille Flammarion, que apresentou, em 1903, na Sociedade Astronômica da França, uma refutação à tese do naturalista inglês Alfred Russel Wallace (1823-1913) “de que o Sol estaria no centro da Via Látea, que a Via Látea representaria o Universo inteiro, que o Sol não teria outra função que iluminar e fecundar a Terra e que nosso planeta é o único habitado”. Infelizmente não tivemos acesso ao original de Wallace, nem ao seu livro sobre o tema. Entretanto, Flammarion ordena sua discussão conforme o artigo a refutar, possibilitando que acompanhemos passo a passo suas idéias.


A tese de Wallace foi apresentada em cinco seções:

1º Será infinito o número de estrelas?

2º A distribuição das estrelas no espaço.

3º A Via Látea.

4º Nosso aglomerado de estrelas.

5º A adaptação da Terra para a vida.

Será instrutivo seguir de perto as justificativas de Flammarion, que serão citadas entre aspas, sem referência, como fizemos acima. Em seguida, serão cotejados as evidências observacionais e os modelos da época com os atuais. Mas antes de atingir 1903, pretendemos apresentar como a idéia de Universo foi evoluindo na concepção humana.




II. Concepções anteriores

A visão do céu estrelado, por si só, é fascinante. A posição do Sol e das estrelas visíveis sempre serviram de referência; sua relação com as estações do ano deve ter sido reconhecida em tempos remotos. O aparecimento das estrelas Sotis (Sirius), pouco antes do nascer do Sol, após longo período de invisibilidade, indicava para os egípcios que a época de inundações do Nilo estava iniciando. À medida que se estabeleceram conexões entre os eventos ocorridos na Terra e os astros, foram criados diversos mitos. O Sol, acalentador da vida na Terra, tornou-se deus dominante em diversas civilizações. A confirmação de previsões baseadas nos astros, tais como a relação das marés com as fases da Lua, reforçou as concepções de que os deuses usavam o céu para dar avisos aos homens. Muitos dos primeiros astrônomos eram sacerdotes encarregados de elaborar calendários para uso civil e religioso.

Os planetas eram identificados por serem “astros errantes” bastante brilhantes e facilmente reconhecíveis devido a seu movimento em relação ao panorama das estrelas fixas. Consideravam-se planetas a Lua e o Sol, além de Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno. A Terra, habitat do homem, parece ser o centro da abóbada das estrelas, que gira com movimento incrivelmente regular. O comportamento dos corpos na Terra parece totalmente diferente, pois mesmo o complicado movimento dos planetas, que em algumas épocas revertem de sentido, mostra grande regularidade. Esta regularidade foi fator importante para que a Astronomia fosse a primeira ciência a se desenvolver.

III. A forma da Terra

A Terra parece plana, sendo considerada de natureza distinta da dos astros, não estando incluída entre os planetas. Entretanto, os povos que se deslocavam por grandes distâncias não encontraram qualquer limite e, quando se afastavam muito do Pólo, viam outras constelações além do horizonte, que novamente desapareciam abaixo do horizonte em seu retorno. Copérnico (1473-1543 d.C.) vivia em regiões nórdicas, deduzindo a forma da Terra a partir de fatos há muito conhecidos: para povos que viajam de qualquer lugar para o norte, o pólo norte da revolução diurna sobe gradualmente, enquanto o pólo sul desce por igual valor. A maior parte das estrelas da vizinhança da constelação da Grande Ursa parece não mais se pôr e no Sul algumas estrelas parecem não mais se levantar.

Portanto a Itália não vê Canopus que é visível para os egípcios.
A Itália vê a estrela mais externa da constelação do Rio, que é desconhecida para nós, de uma zona mais fria. Por outro lado, para povos que viajam para o Sul, essas estrelas levantam mais alto no horizonte, enquanto as estrelas que são altas, para nós ficam mais baixas. Logo é evidente que a Terra está incluída entre os pólos e é esférica. Devemos também acrescentar que os habitantes do Leste não vêem eclipses lunares e solares que ocorrem ao entardecer, e povos que moram no Oeste não vêem as que ocorrem ao amanhecer, enquanto os que moram entre eles vêem as primeiras mais tarde e a últimas mais cedo.

Os astros forneceram, além desses, outros indícios da redondeza da Terra, que haviam sido reconhecidos pelos gregos, como a forma de sua sombra durante os eclipses da Lua. Copérnico usou também argumentos físicos e filosóficos, pois antes do trecho acima especulara sobre a forma do Universo:

"Inicialmente, asseveramos que o Universo é esférico; porque sua forma, sendo
 um todo completo e não necessitando de juntas, é a mais perfeita de todas;
 porque ele constitui a forma mais espaçosa, que é a mais apropriada para conter
 e reter todas as coisas e também porque todas as partes discretas do mundo,
 como o Sol, a Lua e os planetas aparecem como esferas; e porque todas as coisas
 tendem a assumir a forma esférica, um fato aparente em uma gota de água e em
 outros corpos fluidos, quando sob sua própria influência eles se limitam".
                                                                                                                                           (Copérnico)

Portanto ninguém duvidará que essa forma é natural para os corpos celestes.
E continua: que a Terra também é esférica está acima de dúvida, pois ela pressiona de todos os lados para seu centro.

Copérnico estava seguindo a tradição dos gregos de estabelecer e quantificar as relações entre os corpos celestes.

Aristarco de Samos, observando o movimento e as fases da Lua e reconhecendo que elas são decorrentes da iluminação do Sol e da geometria do sistema, inferiu distâncias e tamanhos do Sol e da Lua. Esse e outros modelos podem ser explorados como recurso didático.


Erastóstenes infere o valor do raio da Terra a partir de informações sobre a sombra projetada no dia do solstício de verão, porque soube que o Sol ficava exatamente a pino (no zênite) nos poços de Siena, e mediu no mesmo dia o ângulo de sombra mínima em um obelisco de Alexandria.

Podemos, com recursos simples, repetir estas medidas.
As latitudes (norte) de Siena e de Alexandria correspondem aproximadamente às latitudes (sul) de São Paulo e Porto Alegre. Cabe aqui um importante reparo: o fato de a sombra do Sol ser diferente em Alexandria e em Siena tanto pode ser devido à curvatura da Terra como ao não paralelismo dos raios do Sol. As ilustrações dos livros usualmente não respeitam as verdadeiras proporções, sendo comuns os desenhos que apresentam Terra e Sol de tamanhos semelhantes e muito próximos, com espaçamento incompatível com o tamanho angular do Sol no céu. Desse modo, os raios provenientes do Sol não podem ser considerados paralelos e o método de Erastóstenes não se aplica.

Aristarco já havia mostrado que o Sol deveria estar cerca de 20 vezes além da Lua; Erastóstenes considerou que os raios luminosos provenientes do Sol eram praticamente paralelos. Como foram feitas várias inferências com os dados observacionais, elas não devem ser consideradas “prova”, pois poderiam ser compatíveis com outros modelos em que a Terra não seria esférica, o que, aliás, ocorre. Se forem feitas medidas precisas em vários lugares, mediremos raios diferentes, mostrando que a Terra é achatada.




Amostragem errônea do método de Erastóstenes encontrada no Sol. Ele se mostra muito menor que a Terra e seus raios não incidem paralelamente. Neste esquema, mesmo que a Terra fosse plana, a sombra poderia ser diferente nos dois lugares.
Método de Eratóstenes: A diferença de ângulo entre a sombra em dois lugares foi atribuída ao não paralelismo da vertical nos lugares devido à redondeza da Terra, sendo os raios solares considerados paralelos. Deste modo, o ângulo entre os raios solares e a vertical do lugar seria igual ao ângulo entre estas verticais e, sabendo-se a distância entre os lugares que deveriam ficar no mesmo meridiano, seria possível determinar o raio da Terra.

DISTÂNCIAS DOS ASTROS

Os gregos usaram métodos engenhosos para obter as distâncias dos astros e procuraram aprimorar suas medidas.

Aristarco de Samos calcula que a abóbada estrelada esteja 369 vezes mais longe de nós do que o Sol, distância que, um século mais tarde.

Hiparco vai aumentar para 1200 vezes. O que dá para Aristarco 124.000 raios terrestres e 413.000 para Hiparco.

Arquimedes, no “The sand-reckoner” (O contador de areia), tentando mostrar “por meio de provas geométricas” que pode representar um número maior que o de grãos de areia que caberiam em todo Universo, discute os conceitos e valores numéricos aceitos na época. Segundo ele, “universo” é o nome dado pela maioria dos astrônomos à esfera cujo centro é o centro da Terra e cujo raio é igual à linha reta entre o centro do Sol e o centro da Terra.

Mas Aristarco de Samos criou um livro contendo algumas hipóteses, no qual as premissas levam ao resultado de que o universo é muito maior do que o agora nomeado. Suas hipóteses são que as estrelas fixas e o Sol permanecem sem movimento, que a Terra gira em torno do Sol em uma circunferência, o Sol ficando no meio da órbita; a esfera das estrelas fixas, situada aproximadamente no mesmo centro que o Sol, é tão grande que o círculo em que ele supõe que a Terra gira tem tal proporção com a distância das estrelas fixas como o centro da esfera com a sua superfície. Atualmente, é fácil ver que isso é impossível pois, como o centro da esfera não tem magnitude, não podemos conceber que ele mantenha qualquer razão com a superfície da esfera. Entretanto, devemos considerar o que Aristarco pretende dizer com isso: como concebemos a Terra como sendo o centro do universo, a razão que a Terra mantém com o que descrevemos como “universo” é a mesma que a esfera que contém o círculo em que ele supõe a Terra girar mantém com a esfera das estrelas fixas.

A distância das estrelas fixas tem que ser extremamente grande comparada com a órbita da Terra para o movimento aparente devido ao deslocamento da Terra não ser visto. Tycho Brahe tentou medi-lo e seu fracasso levou-o a desistir de um sistema heliocêntrico, pois implicaria em uma distância de pelo menos 1,4 milhões de raios terrestres. Tycho optou por um sistema intermediário. “Galileu adotou 13 milhões de raios terrestres; Kepler, 34 e, mais tarde, 60 milhões”. Mesmo com a capacidade instrumental do telescópio, que forneceu a Galileu tantas evidências observacionais do sistema heliocêntrico, o deslocamento aparente das estrelas (paralaxe estelar) continuou escapando à detecção até 1838. Entretanto, outro efeito do movimento da Terra, a aberração estelar, foi descoberto por Bradley em 1728.

Como estamos discutindo o papel da História da Ciência no ensino de Física, é importante ilustrar as evidências observacionais que Galileu soube apresentar de modo tão convincente: veja a versão “manipulador de idéias”.

Galileu descobriu as fases de Vênus, que não podem ser explicadas no sistema de
Ptolomeu, e os satélites de Júpiter:

"Temos aqui um argumento notável e ótimo para eliminar as dúvidas daqueles
 que, aceitando com tranqüilidade o sistema copernicano, se sentem, contudo,
 perturbados pelo movimento apenas da Lua em torno da Terra, enquanto ambas
 descrevem uma órbita anual em torno do Sol, até o ponto de considerar que se
 deve rechaçar por ser impossível esta ordenação do universo.
 Com efeito agora temos não mais um planeta girando em torno de outro enquanto
 ambos percorrem uma órbita em torno do Sol, mas certamente quatro estrelas
 que, como a Lua ao redor da Terra, se oferecem aos nossos sentidos errando em
 torno de Júpiter, enquanto todos eles percorrem junto com Júpiter, uma grande
 órbita em torno do Sol no lapso de doze anos".

Galileu também foi o primeiro a reconhecer o caráter estelar da Via Látea, descobrindo enorme quantidade de estrelas invisíveis a olho nu:


“Se observa aquela brancura da Via Látea como uma nuvem esbranquiçada; se o
 óculo for dirigido para qualquer uma delas, toparemos com um assembléia de
 estrelas”.


Mas, o conceito de “esfera de estrelas fixas” já tinha sido posto em dúvida por Leonard.

Thomas Digges que, além da teoria, publicou, em 1576, no “Prognóstico Eterno”, uma ilustração na qual as estrelas estavam distribuídas uniformemente no espaço.

A partir de então, cabe o questionamento sobre a possibilidade de o número de estrelas ser infinito e o Sol ser uma estrela.

Giordano Bruno (1548-1600) defendeu. Koyré compara as idéias de Digges, para quem o céu das estrelas está povoado de anjos, com as de Bruno, a quem atribui maior influência na concepção do mundo do século XVII. O estudo de Digges é antes um esquema que um modelo: a escala é claramente desproporcional.

Os valores relativos das distâncias dos planetas foram obtidos por Copérnico, que continuou usando epiciclos para ajustar as órbitas. O fato de que Mercúrio e Vênus sempre são vistos perto do Sol (ao anoitecer ou ao amanhecer) tem explicação simples no sistema heliocêntrico:

"Suas órbitas são internas à da terra esta especial geometria torna extremamente
 simples construir um modelo em escala, de forma didática.
 Kepler, com base no sistema de Copérnico e nos dados de Tycho Brahe, obteve as
 proporções e os períodos das órbitas dos planetas que permitiram que se  
 descobrisse suas famosas leis".

Já configurou-se  para esquema de Ptolomeu o seguinte:

"Vênus fica em um epiciclo que deve ser alinhado com o Sol".

Esquema de Tycho Brahe:

"Vênus (e Mercúrio) giram em torno do Sol, mas esse se move em torno da
 Terra".

Esquema de Copérnico:
              "Todos os planetas giram em torno do Sol. Vênus, vista da Terra, nunca se afasta
                muito do Sol".

O esquema de Ptolomeu não mostra as fases observadas por Galileu.
CARPEMA.





Nenhum comentário:

Postar um comentário